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Heitor Freire

Dos Embalos à Noite na Acrissul

A Associação dos Criadores do Estado de Mato Grosso do Sul – Acrissul – é uma das associações de classe mais antigas do nosso estado. Foi criada nos anos 30 para congregar os pecuaristas da região, tendo como líderes inicialmente Laucídio Coelho, Etalívio Pereira Martins, Osvaldo Arantes e tantos outros fazendeiros destacados que se uniram criando um espaço para a exposição de gado, centro de negociação e comercialização que, com o passar dos tempos e o crescimento da atividade pecuária, passou a conquistar um espaço cada vez maior, abrangendo aos poucos outras atrações correlatas.

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Heitor Freire

Da Administração Municipal – I

Campo Grande é uma cidade privilegiada sob vários aspectos: pela sua localização geográfica, pela sua história, pelo traçado de suas ruas, pela sua topografia, pelo seu entorno e, principalmente, por sua gente.
A nossa cidade tem tido  administradores municipais de muita competência, dedicação, habilidade e que tornaram  nossa cidade um local agradável para se morar. Campo Grande sempre teve grandes prefeitos. Vou citar alguns, de quarenta anos para cá: Levy Dias – duas vezes –, Marcelo Miranda, Lúdio Coelho, Juvêncio César da Fonseca,  André Puccinelli e Nelson Trad Filho,  estes quatro últimos com dois mandatos cada um, entre outros.
O nosso atual prefeito soube pavimentar com muita competência a sua estrada até o Paço Municipal. Vereador por diversos mandatos, presidente da Câmara Municipal por quatro anos, deputado estadual – com a maior votação naquela legislatura –  com muita habilidade soube vencer resistências e acomodar situações que o elegeram prefeito no primeiro turno em 2004. Sua reeleição em 2008 mereceu dos nossos eleitores uma aprovação de 70%, um dos prefeitos com melhor votação em todo o país.
E, podemos dizer: Nelson Trad Filho está administrando bem a nossa cidade. Bem, em termos, porque há alguns aspectos que merecem reparos. O que é natural. Ninguém é perfeito.
Sou um cidadão interessado em tudo que acontece em nossa cidade, estado e país.
Isto posto, hoje vou tratar da questão que está merecendo um grande destaque o lançamento do IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano, que é um imposto municipal que incide sobre as propriedades urbanas, englobando imóveis edificados e imóveis não edificados. É competência das prefeituras o lançamento e cobrança desse imposto.
Os lançamentos do IPTU que ocorrem anualmente obedecem a critérios definidos pelo prefeito e seguem orientações embasadas em decisões técnicas e políticas.
A decisão técnica decorre da aplicação do valor da Planta Genérica de Valores Venais da Câmara de Valores Imobiliários que atualiza mensalmente os valores venais dos terrenos, no caso do IPTU, toma-se como base o valor da planta do mês de outubro anterior ao ano do lançamento, para os terrenos não edificados.
E usa-se por sua vez da tabela do Sinduscon – Sindicato da Indústria de Construção Civil –, para os terrenos já edificados.
E quando são aplicados os valores definidos com esses critérios, não há o que discutir por causa do embasamento técnico dessas avaliações.
Quando o prefeito decide aplicar critérios políticos para definir o valor do IPTU é que começa o imbróglio. E isto porque esses critérios variam conforme a conveniência da ocasião.
Muitas vezes, isso decorre de um sentimento de não querer onerar a população, aplicando então lançamentos abaixo dos valores definidos pela avaliação técnica; com o passar do tempo esses valores de IPTU mais baixos vão criando uma defasagem que cada vez se acentua mais.
Essa discrepância, no tempo e no espaço, pode chegar a um ponto em que deve prevalecer o critério técnico, o que acaba gerando discussão porque essa atualização de valores causa   muitas reclamações.
É o que está acontecendo agora.
A Prefeitura de Campo Grande  está, naturalmente, revendo os casos discrepantes, quando devidamente apresentados pelos contribuintes.
Lamentavelmente, porém, neste começo de ano  a prefeitura ficou acéfala. Viajaram ao mesmo tempo e por muitos dias, o prefeito, o secretário de Planejamento e Finanças, o secretário de Controle Urbanístico e de Meio Ambiente e também o gerente do Cadastro Municipal. Administrativamente isso não deveria acontecer.
E as informações que foram dadas aos que buscavam esclarecimentos eram as mais desencontradas, o que consequentemente causou exploração política por parte dos adversários do prefeito.
Agora já com os titulares presentes e com os esclarecimentos efetuados, se constata que não são muitos os casos de lançamentos indevidos. Mas todas as reclamações estão sendo revisadas.
Eu mesmo me vi surpreendido com um aumento de 40% do meu IPTU e fui reclamar. E no setor competente fui informado que a majoração decorreu de uma grande valorização imobiliária nos terrenos do entorno da minha casa, o que implicou no aumento do valor do imposto.
O imposto é composto da somatória do valor do terreno com o valor da área edificada. Como profissional do ramo, corretor de imóveis, fui conferir e confirmei: o lançamento está correto. Só me cabe pagar o imposto.
Antes de encerrar, quero dizer que o aumento poderia ser escalonado – por exemplo – em dois ou mais anos, aumentando-se 30% num ano,  30% no outro e o restante no ano posterior. Ficaria mais palatável.

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Heitor Freire

Da Administração Municipal – II

Atualmente sou membro do Conselho Municipal de Desenvolvimento e Urbanização – CMDU – e,  como conselheiro municipal, represento o Sindicato dos Corretores de Imóveis desde 2007. Estou no segundo mandato. O CMDU foi criado na primeira gestão do prefeito Juvêncio César da Fonseca.
A composição do CMDU abrange:
– Os oito conselhos regionais da cidade (Centro, Lagoa, Imbiruçú, Prosa, Segredo, Bandeira, Anhaduizinho e distrito de Anhanduí);
– Representantes das seguintes entidades de classe: Fiems, IAB, Secovi,  Sinduscon, Sindimóveis, Setur, Ussiter, AEACG, ACICG, AGGB, CREA, OAB, Associação dos  Advogados;
– E os seguintes setores da administração municipal: Agetran, EHMA, Planurb, Sesop, Semadur, Seplac, além das concessionárias de serviços públicos: Aguas Guariroba e Assetur.
Por aí já se tem uma idéia da composição eclética do Conselho, que tem como objetivo a participação da sociedade civil nas discussões referentes à política de desenvolvimento do município, englobando as políticas de gestão do solo, habitação, saneamento ambiental, transporte e mobilidade urbana. Ou seja, é bem abrangente.
Essa é uma atividade voluntária, sem qualquer tipo de remuneração –  é um trabalho genuíno de participação comunitária consciente.
A prefeitura de Campo Grande adota o orçamento participativo que permite a contribuição da comunidade na sua elaboração.
Quando a Secretaria de Planejamento e Finanças termina o seu projeto,  apresenta no plenário do CMDU  sua proposta orçamentária para o ano seguinte. Um relator é escolhido entre os conselheiros designados para  elaborar o parecer, o qual depois é submetido ao plenário do Conselho que, uma vez aprovado, é  encaminhado à Câmara Municipal.
Dessa forma, acompanho constantemente o desempenho da administração municipal, o que me permite acesso a informações sobre os mais variados aspectos.
O assunto de  hoje é o asfalto que liga o aeroporto ao centro.
Trata-se de uma obra que faz parte da Via Morena que abrange também a parte que era ocupada pelos trilhos da NOB.
É uma avenida que faz justiça ao traçado inicial da nossa cidade, bem larga e em condições de permitir um fluxo rápido do tráfego não só do aeroporto, mas também para quem chega e parte para a região oeste do nosso estado: Aquidauana, Anastácio, Miranda e Corumbá.
Pois bem, a avenida está quase concluída. Quase, porque até hoje não foi feita a sinalização para que o seu uso seja utilizado com tranquilidade e segurança. Como o poder público municipal liberou o tráfego na região, se conclui que recebeu a obra.
E como foi feito o recebimento dessa obra, assim incompleta? Quem circula por lá, principalmente à noite sente a insegurança que reina no local. E quando chove? A qualquer momento poderá se registrar um acidente grave. Por  falta de fiscalização da Secretaria de Obras (Seintrha)?  E  como a Agetran  liberou o tráfego no local? O arremedo de sinalização – que é um faz de conta –  não assegura a sua utilização com segurança.
Que não venham alegar que somente com a conclusão total da obra, poderá será feita a sinalização. Porque o que hoje falta para a conclusão do projeto no local,  é  a construção do espaço privativo para ônibus e a área da ciclovia, que em nada comprometem ou impedem a utilização das pistas que já estão prontas.
A responsabilidade maior recai naturalmente sobre os ombros do prefeito, que precisa prestar contas à população da nossa cidade.
Um outro assunto que precisa ser resolvido pela administração municipal é que há poucos dias fomos informados pelos meios de comunicação que o prefeito encaminhou à Câmara Municipal um número muito grande de áreas para serem desafetadas – nome que se dá quando uma área pública tem a sua destinação original alterada. Ora, essa medida deveria preliminarmente ser encaminhada ao CMDU, para que este analisasse o projeto e emitisse o seu parecer. O que não foi feito.
Na administração Puccinelli no ano de 1999, aconteceu a mesma coisa. Quando o então prefeito promovendo a desafetação de diversas áreas, foi informado da necessidade de obter o parecer prévio do CMDU, mandou parar todas as ações  e encaminhou o projeto para o plenário do Conselho – eram mais de seiscentas áreas –, o que exigiu um esforço hercúleo para se conhecer todas as áreas. Mas foi feito.
Quem dirigiu toda essa operação foi o então conselheiro dr. Arnaldino da Silva – de saudosa memória –, que durante quatro exaustivos dias, acompanhado dos demais conselheiros José Marcos da Fonseca, João Bosco Urt Delivizio, Carlos Eduardo Marun e Lázaro Bonifácio da Silva,  visitou todas as áreas, elaborando o parecer que foi aprovado pelo plenário do CMDU, em reunião extraordinária do dia 08/12/99.
Neste caso, mesmo posteriormente à ação do prefeito, foi respeitado o procedimento que determinava o seu encaminhamento ao CMDU.
O que não foi feito nesta oportunidade, cuja omissão não se justifica, e que precisa ser reparado.
Outros aspectos da administração pública municipal merecerão minha atenção em artigos futuros.

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Heitor Freire

Santa Ca(u)sa I

Se há uma entidade que sempre mereceu respeito da nossa população é a Santa Casa.
A Santa Casa de Campo Grande foi fundada por um grupo de cidadãos abnegados, que se sensibilizaram com a questão da saúde da população. Logo que o povoado passou a município, não havia local nem espaço para  atendimento médico.
Assim, em 1922, esse grupo de cidadãos liderados por Eduardo Santos Pereira se reuniu e decidiu fundar essa instituição modelar e voltada para o atendimento da população mais carente, a nossa Santa Casa.
A Santa Casa é propriedade da Associação Beneficente Santa Casa, entidade sem fins lucrativos. Durante toda a sua existência foi administrada por cidadãos  dedicados, prestantes, sensibilizados pela questão social e sem nenhuma remuneração financeira.
No entanto, a partir de uma intervenção indevida do poder  público em 2005, num ato que contraria o estado de direito em que vivemos,  a administração municipal achou por bem  tomar  a Santa Casa.
Apropriaram-se indevidamente do seu nome, do seu CNPJ e das suas contas bancárias, com respaldo incompreensível de gerentes de bancos,  e passaram a emitir cheques e documentos em nome da associação, sem que tivessem para isso a mínima competência legal.
Pois quem tinha a prerrogativa de movimentação das contas era a diretoria eleita legalmente, que foi destituída por um ato de força. O que aconteceu com a Santa Casa é inadmissível e, lamentavelmente, sua administração permanece assim constituída, até hoje.
A Associação Beneficente de Campo Grande é uma entidade de direito privado, ou seja, tem vida própria, independente.  Ela se mantém financeiramente com o faturamento através do SUS, dos planos de saúde (Unimed e outros) e do atendimento particular. Quem pode pagar,  paga. Quem não pode, é atendido gratuitamente
E hoje, seus atuais administradores – nomeados e pagos pelo poder público –  têm salários elevados, remunerados por valores muito acima dos praticados em qualquer empresa de grande porte em  nosso estado.
Longe de resolver a questão financeira – principal argumento para “justificar” a intervenção –,  a junta interventora aumentou a dívida da Santa Casa a níveis estratosféricos. Na época da intervenção foi feita uma auditoria que encontrou uma dívida de R$ 50  milhões. Hoje ascende a mais de R$ 100 milhões. Esses “administradores” terão de prestar contas de suas atividades que elevaram a dívida a patamares tão altos. E arcar com as responsabilidades daí decorrentes.
E o pior, não resolveram a questão.
O Correio do Estado, de 4 de fevereiro último, no Caderno B,  seção Diálogo, informa o descaso a que foram submetidos os pacientes da Santa Casa quando chegaram de madrugada para obter senhas de atendimento do endocrinologista de plantão que começaria às 7 horas, mas  não foram atendidos. Mais tarde,  um guarda avisou que o médico estava “de folga”. Termina a nota: “Lamentável!”
As entidades de classe dos médicos como  a Associação Médica de Mato Grosso do Sul, o Conselho Regional de Medicina – MS e o Sindicato dos Médicos de Mato Grosso do Sul, em nota de “Alerta à População”, publicada no Correio do Estado do dia 11 deste mês, previne a população  que  esteja atenta com o que está acontecendo. Diz a nota “…Novamente, trazemos ao conhecimento da população a situação caótica em que se encontram os hospitais referenciados para o atendimento emergencial em nossa capital, as unidades de pronto atendimento e, em especial, a SANTA CASA (destaque nosso), maior hospital do nosso Estado…”
A Santa Casa hoje está sucateada. Já foi referência nacional em transplante renal. Dos seus 750 leitos originais, hoje estão disponibilizados apenas 450.
Campo Grande precisa saber quem são os associados da Santa Casa, que acompanham estupefatos, o desenrolar dos fatos, cuja diretoria tomou  todos os procedimentos jurídicos que, estranhamente, não encontraram respaldo em nossos juízes e desembargadores.
O quadro da Santa Casa é constituído de mais de 180 associados. Dentre estes, destaco, entre outros:  Wilson Barbosa Martins, que governou duas vezes o nosso estado;  Renato Ribeiro, pecuarista de renome – que inclusive foi também  presidente da Santa Casa; Lúdio Coelho, ex-prefeito e ex-senador; Antonio Barbosa de Souza,  pecuarista de grande porte; senador Ramez Tebet – que foi associado até a sua morte; Juvênio César da Fonseca, ex-prefeito e ex-senador – que também foi presidente da Casa; Levy Dias ex-prefeito e ex-senador; Valter Pereira, ex-senador; Marcilio Tezeli, ex-gerente do Banco do Brasil; senadora Marisa Serrano; senador Delcídio do Amaral Gomes; Jorge Elias Zahran; Arthur D’Àvila Filho, que foi oito vezes presidente da Santa Casa – verdadeiro abnegado da causa; Sinval Martins de Araújo, empresário de grande porte, presidente da entidade duas vezes. Eu também sou um dos associados.
Voltarei ao assunto.

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Heitor Freire

Da Fronteira

Há um ditado popular que diz: cidade pequena, inferno grande.
Não é bem assim, mas nas cidades pequenas, como todos se conhecem e sabem das vidas, uns dos outros, há sempre uma circulação de mexericos espalhados por quem se dedica a espionar a vida alheia.
Sou nascido em Pedro Juan Caballero, Paraguai. Do lado de cá da fronteira, temos a nossa Ponta Porã.
Voltei para Ponta Porã, já com 21 anos, como funcionário do Banco do Brasil. E lá trabalhei durante sete anos. Casei-me e lá nasceram minhas três primeiras filhas.
Convivendo com o povo observei uma série de comportamentos interessantes; uns jocosos, outros graves e ainda alguns mais dramáticos.
Havia em Ponta Porã, uma família tradicional, constituída por marido, mulher e três filhas. Estas já moças eram alegres, bem nascidas, comunicativas e cortejadas.
Destas, uma se sobressaía pela beleza e simpatia. E por isso era alvo de comentários  maldosos. Esses comentários chegaram aos ouvidos de sua mãe, que era uma senhora daquelas que não manda recados e bem disposta. Mas desta vez, pelo fato de os comentários terem vindo de uma outra moça, também de família tradicional, a tal mãe abriu uma exceção e mandou avisar  que se ela não parasse com os seus mexericos,  tomaria suas providências para preservar a honra da filha.
Os comentários não pararam.
A igreja da cidade era bem no centro da cidade,  dentro da praça.
Num domingo quando a “mexeriqueira” chegava para a missa das nove horas – a mais concorrida –, com seu traje domingueiro para desfilar ante a sociedade fronteiriça, se viu interpelada à porta da igreja, pela mãe da “ofendida” que, sem maiores entretantos, foi se chegando, agarrou a moça, derrubou-a no chão, tirou sua calcinha, e esvaziou um vidro de pimenta malagueta na parte mais íntima da moça, que começou a gritar desesperadamente. O padre, todo paramentado –  naquela época ainda se usava batina –,  correu em direção à mãe, em altos brados, pedindo a ela que parasse de uma vez com isso, onde já se viu? Ela se virou para o padre, e disse: “Sai daqui homem de saia, senão vai sobrar prá você”. Isso acabou com o ímpeto salvador do padre, levando o pobre homem a  bater em retirada, para dentro da igreja. Ninguém mais ousou se meter com ela. Quando terminou a sua “vendetta”, a mãe avisou: “Isso é para você aprender a não falar mal de ninguém. Se continuar, da próxima vez, vai ser pior”.
Os pais da moça  tinham uma casa comercial. Eles eram benquistos na cidade. Sua casa era um local em que algumas pessoas, costumeiramente, se reuniam às manhãs, tomavam um café e depois cada um tomava o seu rumo.
Numa dessas reuniões matinais, estava presente um motorista de caminhão muito alegre, conversador, galhofeiro, gozador e contador de histórias, que resolveu inventar uma “pegadinha” para a “mulher braba”. Ele, dirigindo-se à dona do estabelecimento – aquela mesma do corretivo acima –, disse a ela: “Dona Fulana, a senhora não sabe o que me aconteceu nesta última viagem. Eu ia para São Paulo, e quando vi, na beira da estrada, tinha uma senhora que carregava um saco branco bem grande, nas costas, fazendo sinal pra eu parar. Eu parei. Ela chegou e pediu carona até um lugar perto dali, porque o saco era muito pesado. Com pena dela, achei melhor dar carona. O saco ficou meio mal acomodado na cabine, mas fomos em frente. Quando chegamos ao seu destino, ela rapidamente, agradeceu, desceu e foi embora”. Aí então a senhora perguntou ao narrador: “E o saco?”. E este fazendo um sinal com a mão envolvendo suas partes genitais e já correndo, falou: “Tá aqui”. Levou um carreirão de mais de uma quadra. Passou três meses sem aparecer para o café matinal.
Há também um terceiro episódio envolvendo a mesma família. Em Ponta Porã, havia dois clubes: o Recreativo e o Grêmio.
Num baile, no Recreativo, estava esta senhora com suas filhas. Naquela época havia uma tradição, a moça que fosse convidada para dançar, sempre devia aceitar, mesmo que o rapaz que a convidou  não lhe agradasse. Se não, dava confusão.
Pois bem: um rapaz, paraguaio, convidou uma das filhas da nossa protagonista, que, a contragosto aceita. E enquanto dançavam informou ao seu par que ela era comprometida e se fosse convidada de  novo, não sairia para dançar, ao que o rapaz lhe respondeu: “Então vá para casa”. Quando terminou a dança, ela contou o acontecido à sua mãe.
Ao começar a nova contradança, veio o rapaz novamente e, com muita petulância, convidou a moça para dançar. A mãe, tomando a frente da filha, disse para o moço: “Ela já não lhe falou que é comprometida?” Ao que este respondeu: “Então que vá para casa”. Ao que ela retrucou: “Não vai e não vai dançar com você”. Ato contínuo a mãe  quebrou uma garrafa de cerveja e partiu para cima do moço, que deve estar correndo até hoje.

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Heitor Freire

Nos tempos da antiga Rua 7 – I

Quando a minha família – constituída por meus pais, eu e meus cinco irmãos – chegou a Campo Grande, em 1947, egressos de Pedro Juan Caballero (Paraguai) – onde, por força da Revolução daquele ano, meu pai perdeu todo o seu patrimônio –,  nos acomodamos na casa dos Gamarra, na Rua 15 de Novembro. Depois mudamos para a Rua Maracaju, numa casa cujos fundos davam para o córrego Reveillau. Daí nos mudamos para a Rua Barão do Rio Branco, em casa de propriedade do sr. Antônio Sarubbi, ao lado da do dr. Generoso Fontes.
Nesse período, eu – com sete anos, alfabetizado – ajudava meu pai no seu café, lanchonete e engraxataria, no espaço que ele obteve, por locação, no Bar Bom Jardim, de propriedade de Francisco Rodrigues, um português muito atencioso e simpático.
Naquela época, eu vendia bilhetes de loteria na rua. Saía do Bar Bom Jardim, descendo em direção à avenida Mato Grosso, pelo lado esquerdo  da rua 14 e depois voltava pelo outro lado, oferecendo os meus bilhetes a todas as pessoas que encontrava, sem exceção. Uma vez, entrei na Casa Murad que ficava na esquina da rua 14 com a Maracajú. Seguindo o meu costume fui oferecendo os bilhetes a todas as pessoas que ali se encontravam. Estava de costas uma senhora a quem também ofereci. Esta ao se voltar deu de cara comigo. Era minha mãe que começou a chorar. Eu lhe dei um beijo e continuei com o meu trabalho.
Em outra oportunidade, dentro do Bar – que não vendia cigarros – eu circulava regularmente oferecendo os bilhetes e também cigarros. Fazia esse roteiro a cada 15 minutos mais ou menos. E oferecia para todos. Uma vez, um cliente que estava sentado há um determinado tempo, me chamou e disse: “Olha aqui guri vou te dar esta nota ( era de 5 mil réis), e faça-me o favor de não passar mais perto da minha mesa, viu?”  
Depois, o meu avô materno,  ervateiro em Ponta Porã, adquiriu o Mate Índio, localizado na Rua Antônio Maria Coelho, ao lado do Cine Rialto.  Meu pai passou a gerenciar o estabelecimento. Eu entregava a erva-mate  ensacada em sacos de aniagem, de 60 quilos, transportando-os em uma bicicleta, que tinha na frente uma roda menor, com um  espaço em cima da roda, para acondicionar  a mercadoria. A grande complicação é que o peso ficava localizado na frente e eu, com nove anos, franzino, sentia dificuldade em equilibrar a bicicleta. Mas sempre dava um jeito.
Passado um tempo,  meu pai adquiriu o Salão Cristal – barbearia localizada na Rua 14 de Julho, centro, onde é hoje a Galeria São José. Os barbeiros que ali trabalhavam eram verdadeiros artistas.
Lembro-me do Joaquim, um português, de bigode, com os cabelos repartidos ao meio, que tinha entre os seus fregueses o dr. Ary Coelho, na época prefeito de Campo Grande, sempre vestido de terno, e que ao chegar tirava o paletó, deixando à mostra o seu revólver na cintura. Trabalhavam também no salão o Zezão, assim apelidado pela sua altura elevada; o Álvaro, procedente de Porto Murtinho e o “seu” Telésforo, a quem meu pai vendeu o salão, posteriormente.
A venda do salão foi feita quando meu pai recebeu um bolicho como pagamento de um devedor, localizado na Rua 7 de Setembro, entre as Ruas 13 de Maio e Rui Barbosa. Isso em 1952, em pleno apogeu da zona do meretrício.
Do lado esquerdo da nossa casa, separada por uma cerca de arame, havia uma casa dita “de mulheres”. Na frente, se localizava o famoso sobradinho da dona Violeta. Do lado direito a Serralheria Moderna, do Toninho, em imóvel alugado do Antônio Lanteri. Ao seu lado, outra casa “de mulheres”. Em frente desta, o bar do Jabatá.
Ou seja, éramos uma ilha cercada de casas “de mulheres” por todos os lados. Quando para lá nos mudamos, a minha irmã Haydée tinha dez anos. E a Dorila, sete. Completaremos o nosso relato em outro artigo, na sequência deste.

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Heitor Freire

O Nó Gordio

O nó górdio era um enigma que se apresentava aos homens da Antiguidade, desafiando a argúcia, a inteligência e a capacidade de cada um, prometendo-se  àquele que ousasse elucidá-lo, desatá-lo, a conquista da Ásia Menor.
Dizia a lenda que o rei da Frígia morreu sem deixar herdeiro e que, ao ser consultado, o Oráculo anunciou que o próximo rei chegaria à cidade num carro de bois. A profecia foi cumprida por um camponês, de nome Górdio, que foi coroado. Para não esquecer de seu passado humilde ele colocou a carroça, com a qual ganhou a coroa, no templo de Zeus, e a amarrou com um nó a uma coluna, nó este aparentemente impossível de desatar.
Górdio reinou por muito tempo, e quando morreu, seu filho Midas assumiu o trono. Midas expandiu o império, porém não deixou herdeiros. O Oráculo foi ouvido novamente e declarou que quem desatasse o nó de Górdio dominaria toda a Ásia Menor.
O nó górdio remonta ao século VIII a.C.
Quinhentos anos depois, em 334 a.C., Alexandre Magno se viu desafiado a desatá-lo. Após uma minuciosa análise, desembainhou a espada e cortou o nó górdio. Ao cortá-lo e não desatá-lo, Alexandre não cumpriu o desafio, que, dizia a lenda, daria a quem o fizesse, o domínio de toda a Ásia Menor, que ele conquistou, mas teve uma morte prematura, aos 33 anos. Assim a sua vitória teve uma curta duração, ele praticamente não desfrutou do seu triunfo.
A questão básica é que não adianta usar de esperteza. E isso vale para tudo na vida. Cada um de nós tem um nó górdio para desatar. E não adianta usar de estratagemas, buscando soluções paliativas, dar um jeito, que não vai resolver a questão. O nó tem de ser desatado mesmo. E com muito conhecimento e sabedoria.
A questão é complexa. Só o fato de saber da existência desse nó, desse enigma,  já nos dá uma vantagem muito grande, pois passamos a entender uma realidade que a poucos é permitido conhecer.
A decifração do enigma não tem tempo para ser elucidada. Pode demorar milênios. Mas, fatalmente chegará o momento em que cada um se verá confrontado com essa situação. A preparação para esse momento culminante leva muitas encarnações. Ou não. Como tudo na vida, depende de cada um. Da sua formação, do seu trabalho interior, do seu autoconhecimento.
Um ponto a ser destacado é que a questão não é complicada. Volto a dizer, é complexa. Há uma grande diferença entre complicação e complexidade. Hoje é muito comum ouvirmos a cada momento: “Isso é complicado”. As pessoas repetem esta expressão, mecanicamente, automaticamente, sem prestar atenção ao que estão dizendo, ante qualquer problema que surge. E assim acabam complicando mesmo pelo mau uso da palavra. Complexo quer dizer que é algo composto de muitos fatores ligados entre si, em torno de um ponto central.
William Shakespeare já disse por intermédio de Hamlet: “Há mais coisas entre o céu e a terra, do que supõe nossa vã filosofia”, sintetizando dessa forma magistral, um entendimento dos grandes e variados desafios que todos nós devemos encarar.
“Se compreendes, as coisas são como são; se não compreendes, as coisas são como são”. Este princípio da ciência esotérica nos mostra que não adianta fugir da questão. O fato de não aceitarmos ou não compreendermos os mistérios da vida, da existência, não nos desonerará, não nos livrará dos seus efeitos.
Assim, por uma questão de inteligência é melhor encará-los mesmo que isso represente algo aparentemente insuperável. Porque na realidade, todos nós temos também o conhecimento indispensável para superar qualquer situação, condição que nos foi dada pelo nosso Pai Altíssimo. Mas é preciso ter a coragem e a confiança para não fugir dos problemas e resolvê-los.
Um dos primeiros passos, é começar a nos desligar dos laços que nos prendem às mais diferentes religiões. Porque todas se apresentam como o único caminho.
No livro “Aos pés do Mestre”, foi apresentado a Krishnamurti os quatro passos que  levam ao caminho da libertação: discernimento, desapego, boa conduta e amor.
Discernimento é a capacidade de decidir o que fazer ou não fazer.
Desapego é a libertação de todas as formas de apego: religião, família, trabalho. O que não quer dizer que devamos  desprezá-las. Mas usar o discernimento.
Boa conduta é a  ação consciente e verdadeira que orienta todos os nossos atos.
O amor é o elemento que coroa tudo isso.
Estes conceitos aqui apresentados são fruto de uma investigação e meditação que ao longo da minha vida tenho praticado e que agora compartilho com os meus leitores.

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Heitor Freire

Das Mulheres Bíblicas V

A figura de Maria, mãe de Jesus, é a mais emblemática no que diz respeito ao gênero feminino. A sua importância é fundamental. É tão forte que a Igreja Católica, sentindo  a sua força, inventou para cada país da América Latina uma padroeira, cuja aparição sempre ocorria de modo misterioso, milagroso. Como exemplo, temos no nosso país, a maneira como foi encontrada a imagem de Nossa Senhora da Aparecida.
Não foi diferente nos demais países. Assim, temos, por exemplo, no Paraguai, a Virgem de Caacupé; no México, a Virgem de Guadalupe; na Argentina, a Virgem de Luján; na Bolívia, a Virgem de Copacabana, no Chile, a Virgem do Carmo, e assim por diante. Isso foi trabalho dos jesuítas que sentiram que com essa ação conseguiriam convencer o povo com mais facilidade por meio da devoção pela mãe de Jesus, por dois motivos:  primeiro, por estimular a adoração que leva sempre à dependência e à idolatria; e  segundo,  em razão do apelo de mãe que, em qualquer lugar, em qualquer língua e em qualquer latitude é muito forte. E  Maria, mais ainda.
Maria, com 16 anos, noiva de José, recebe a visita do Anjo Gabriel, que lhe anuncia a concepção divina de Jesus, o que provoca nela uma reação natural, perguntando como se daria isso, pois não conhecia homem. Ante a resposta de Gabriel, de que ela seria coberta pelo Espírito Santo, aceita e se submete pacificamente à Vontade Superior. Nesse episódio há uma questão a ser elucidada: todo o texto bíblico anuncia Jesus na linha sucessória de Abraham e de Davi. Quem é descendente deles é José e não Maria.  Sendo assim se a linha sucessória prevalece, Jesus é filho de José. Se prevalecer o anúncio de Gabriel, a concepção se fez por ação do Espírito Santo.
Abstraindo-se essa questão que, para mim é irrelevante – porque o que vale é o exemplo que ele deu de amor ao próximo e os  ensinamentos que deixou perpetuados –  Jesus foi tão fundamental que a história da humanidade é narrada, antes e depois do seu nascimento. Não dá para imaginar o mundo ocidental sem a presença de Jesus.
O fato inquestionável é que Maria é mãe de Jesus. E a maternidade é uma certeza; a paternidade, uma possibilidade, como sempre repete o dr. Malcom Montgomery, renomado ginecologista brasileiro. E como tal Maria, teve uma influência muito forte na vida de Jesus. Acompanhou-o em toda a sua pregação, procurando entender o que ele ensinava, sendo acometida, muitas vezes, de grandes indagações. A ponto de Jesus em determinada ocasião, no epísódio do seu sumiço aos doze anos no templo, repreendê-la asperamente.
Como mãe devotada, mesmo não entendendo muito bem  o que ele fazia, ela nunca deixou de ser-lhe totalmente fiel e dedicada.
Outro ponto a considerar no que se refere a Maria, é a oração que lhe é dedicada: a Ave- Maria. Na segunda parte da oração reza-se “Santa Maria, mãe de Deus”. Maria é mãe de Jesus, não de Deus.  Deus não tem mãe. A oração como um todo foi aprovada pelo papa Sixtus V, no final do século XVI. O que, evidentemente, não diminui sua importância. Mas para que a oração seja veraz, deve-se rezar: “Santa Maria, mãe de Jesus”, que é como eu e a minha mulher, Rosaria, rezamos. Aliás, foi ela [Rosaria], que há muitos e muitos anos, chamou minha atenção para esse detalhe.
Entre as mulheres bíblicas – considerando-se a Bíblia como um todo, englobando também os evangelhos – sem dúvida nenhuma, uma das mais enigmáticas e importantes é Maria de Magdala, depois conhecida como Maria Madalena.
Maria Madalena, ao que tudo indica, era uma das mulheres “que socorriam a Jesus com suas posses”. Há também uma outra interpretação, de que ela teria sido a adúltera que foi salva por Jesus do apedrejamento. Mas ela não era casada, e como tal, não poderia ser adúltera. O que se procurou desde sempre foi uma tentativa de desmoralizá-la.
A sua importância na Cristandade,  é fundamental. Maria Madalena esteve o tempo todo acompanhando Jesus, seguindo-o até o fim. Junto a Maria, sua mãe, assistiu a sua crucificação. Ela é tão importante que na ressurreição, foi a ela que Jesus apareceu. Foi ela também que comunicou aos apóstolos – os quais com exceção de João se dispersaram, com medo, escondendo-se – que ele havia ressuscitado.
Para confirmar e consagrar a sua importância, ela é referida nominalmente mais de dez vezes no Novo Testamento. Foi também a única mulher mencionada pelos quatro evangelistas. Foi ela a encarregada de proclamar a mensagem. Uma mulher: Maria Madalena.
O carinho e o respeito que Jesus lhe proporcionava eram tão grandes que despertavam – e ainda hoje despertam – ciúmes, levando a sua ação a ser totalmente distorcida. Diz-se que Pedro, inclusive, tinha muito ciúme dela.
Maria Madalena foi a pessoa mais próxima de Jesus em toda a sua caminhada. A sua dedicação era tão grande que acabou suscitando uma versão totalmente deturpada, sem confirmação,  procurando-se diminuir a sua importância.
A Igreja Católica estigmatizou Maria Madalena como uma mulher promíscua, devassa. Faz pouco tempo que o Vaticano corrigiu essa sua posição. Ela é considerada santa pelas Igrejas Ortodoxa e Anglicana.
O Evangelho de Maria Madalena – encontrado em 1896, em um mosteiro egípcio – relata que ela teria sido uma discípula de Jesus de suma importância, à qual ele teria confiado informações que não foram passadas aos outros discípulos, o que seria a causa dos ciúmes entre eles.
Com este artigo encerro a série “Das Mulheres Bíblicas”.

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Heitor Freire

Das Mulheres Bíblicas IV

A rainha Vasti era mulher de Assuero, rei da Assíria, que dominava um vasto império, desde a Índia até a Etiópia, composto por 127 províncias.
Vasti era uma mulher de  beleza invulgar.
Naquela época, no terceiro ano do seu reinado,  o rei Assuero decidiu oferecer um banquete a todos os seus oficiais e servos: chefes do exército da Pérsia e da Média, nobres e governadores das províncias.
Ele queria lhes mostrar a riqueza e a glória de seu reino, e o banquete se estendeu por 180 dias.
Também a rainha Vasti ofereceu um banquete para as mulheres no palácio real de Assuero. No sétimo dia, estando já alegre o coração do rei por causa do vinho, ele ordenou aos sete eunucos que serviam na sua presença que trouxessem a rainha Vasti com o diadema real, para exibi-la ao povo e a seus oficiais e convidados.
Vasti já conhecendo o rei, e sabendo o que iria acontecer, e não querendo se tornar objeto de cobiça e adoração, simplesmente se recusou a obedecer à ordem do marido – demonstrando assim uma coragem inaudita,  pois naquela época o poder absoluto de um rei não admitia ser contrariado. A recusa de Vasti foi feita de forma pública,  ostensiva e comunicada ao rei perante os seus mais altos e graduados oficiais e os governadores das províncias.
O rei enfureceu-se; consultou os especialistas na ciência das leis, que o aconselharam a baixar um decreto real determinando que a rainha Vasti não mais se apresentasse à sua presença, com a perda da condição real, pois a sua conduta poderia estimular outras mulheres a agir da mesma maneira. Em conseqüência, ficou vago o trono da rainha.
O rei Assuero então expediu um édito real, procurando uma nova rainha, e determinou que todas as jovens virgens se apresentassem ao eunuco real Egeu, que as selecionaria e prepararia para serem apresentadas ao rei.
Ester, hebréia, sobrinha de Mardoqueu, era muito bonita, e também foi encaminhada ao eunuco real. Ela recebeu uma instrução de seu tio, para que em nenhum momento declarasse sua condição de hebréia.
Ester agradou a Egeu e recebeu a proteção dele. Ao ser apresentada ao rei Assuero, ele a escolheu e lhe impôs o diadema real sobre a cabeça, tornando-a a rainha no lugar de Vasti.
Estando Mardoqueu comissionado à Porta Real, ouviu dois eunucos reais –  Bagatã e Tares – tramarem a morte do rei. Transmitiu este fato a Ester que, por sua vez, comunicou ao rei, em nome de Mardoqueu. Investigado o fato, confirmou-se a traição o que causou o enforcamento dos dois eunucos.
Amã, um amalecita – povo historicamente inimigo dos hebreus – tinha uma grande projeção junto ao rei. Todos os servos do rei se ajoelhavam e se prostravam à sua passagem, pois esta era a ordem  real.  Todos, menos Mardoqueu, o que deixava Amã enfurecido.
Ao identificar Mardoqueu como hebreu, Amã, usou o seu prestígio perante o rei, conseguindo deste a edição de um decreto real determinando a total extinção do povo hebreu. A ordem era de matar a todos, homens, mulheres e crianças, em data que foi marcada: dia 13 do décimo segundo mês, que é Adar.
Para punir Mardoqueu, Amã, aconselhado pela sua mulher e por assessores, mandou construir uma forca com 50 metros de altura para nela enforcá-lo.
Mardoqueu, ao tomar conhecimento do decreto real de eliminação dos hebreus,  enviou uma mensagem a Ester, relatando-lhe os fatos e pedindo sua intercessão junto ao rei. Ela, inicialmente vacilou, mas depois de receber uma exortação de seu tio, assumiu o compromisso de falar ao rei.
E assim ela fez, oportunidade em que informou ao rei sua condição de hebréia e pertencente ao povo que seria dizimado. O rei, já com o coração agradecido a Mardoqueu pelo seu ato e também apaixonado por Ester, decidiu revogar o seu próprio decreto.
O rei havia relido as crônicas do reino, onde estava registrada a ação de Mardoqueu livrando-o da trama dos eunucos contra a sua vida. Esse registro lembrou ao rei que nada havia sido feito para reconhecer o ato de fidelidade demonstrado por Mardoqueu.
O rei, então, chamou Amã e perguntou-lhe o que deveria fazer para reconhecer e destacar o ato de um súdito que merecesse toda sua gratidão e reconhecimento. Amã, pensando que o rei se referia a ele, disse: “Que se lhe vista a veste real, e que seja colocado num cavalo da cavalariça real, também todo paramentado, e desfilasse pelas ruas e praças da capital do reino, tendo o cavalo puxado por um nobre de alta linhagem, proclamando: assim se faz a um súdito que o rei quer honrar”.
Disse-lhe então o rei: “Este súdito é Mardoqueu, e assim determino que se cumpra o que você falou, e é você quem vai puxar o cavalo cumprindo exatamente tudo o que você  disse”. E assim foi feito, com um profundo constrangimento de Amã.
A rainha convidou Amã para um jantar junto com o rei. Nessa oportunidade contou ao rei que o autor do decreto de extinção do seu povo era Amã, que se ajoelhou pedindo clemência. O rei então determinou que Amã fosse enforcado na forca que mandara construir para Mardoqueu.
Registra-se a coragem de Ester de dirigir-se à câmara real, à qual ninguém tinha acesso sem ser chamado pelo rei. O seu ato foi considerado uma ação verdadeira de libertação do povo hebreu, que assim deixou de ser exterminado e    passou a exterminar  seus inimigos. Para comemorar este fato, foi instituído o Dia dos Purim, em memória desses fatos.

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Heitor Freire

Do Tráfico de Drogas

A nossa população está assistindo estarrecida a essa verdadeira guerra urbana que está acontecendo no Rio de Janeiro.
Além da violência crescente que nos oprime –  pois mesmo quem não reside no Rio está sentindo a pressão, até por solidariedade – aumentando cada vez mais, assistimos também estupefatos ao total despreparo das nossas autoridades.
É impressionante como não resistem às luzes das câmeras de televisão. Começa com a atitude irresponsável do governador do Rio, Sérgio Cabral. Este senhor revelou há poucos dias que a Marinha iria entrar no combate efetivo ao crime. Essa informação é reservada, confidencial, quase secreta. Mas sua excelência não governa nem a sua própria língua e acaba informando a todos qual é a estratégia que está sendo adotada, dando condições aos bandidos para se organizarem e traçarem também as suas estratégias de defesa.
Assistimos também a um coronel da PM, chefe de relações públicas, todo paramentado com colete à prova de balas, etc., para dar uma entrevista à Rede Globo, informando que o estado dispõe de um efetivo de 18.000 homens e que estavam prontos para invadir o morro do Alemão. Só faltou marcar a hora. E mandar um beijinho para sua mãezinha: “Oi mãe, estou na Globo”.
Imaginem leitores, o que aconteceria com as tropas aliadas quando desembarcaram na Normandia para invadir o continente europeu, se o general Eisenhower – comandante- em-chefe das forças aliadas –  resolvesse dar uma entrevista à rádio BBC, – dando vazão ao seu ego –  para dizer o que se estava preparando para a ofensiva que acabou libertando a Europa.
Pois é a mesma situação absurda que estamos assistindo com as autoridades maiores do Rio dando entrevistas a torto e a direito. É impressionante como não resistem a um microfone.
Todo um aparato preparado para atacar os bandidos saindo pelo ralo e colocando em perigo maior os nossos corajosos soldados.
A situação do tráfico envolve duas pontas: a primeira, a organização de venda e de estímulo ao consumo de drogas, e a segunda, os usuários. O que observamos é que todo o combate se restringe unicamente ao tráfico em si. E quanto aos usuários? Além da imensa dedicação de uma plêiade de pessoas que por meio de entidades associativas procuram conscientizar a nossa população do perigo que representa o uso de drogas, nada mais se faz.
Há setores do governo que também se dedicam a fazer um trabalho de resgate, procurando tirar os usuários das garras das drogas.
Mas só isso não basta. Se bastasse, não estaríamos assistindo a um aumento cada vez maior de usuários. É preciso também penalizar o usuário. Pois é ele, a rigor, quem  financia o mercado do tráfico.  
E como a droga se dissemina? Por intermédio de um comércio que envolve fornecedores e usuários. E é um comércio mesmo.
Os governos procuram, cada um a seu modo, efetuar uma ofensiva que procure inibir os traficantes para a continuidade do comércio da droga, por meio de uma ação policial permanente,  mas que está se mostrando ineficiente. Por quê? Porque atua  somente no combate direto ao tráfico, na ponta da sua comercialização  e não na sua fonte de alimentação que é onde se encontra o elemento  de incremento do negócio, o usuário.
O tráfico é um comércio, e como tal, só prospera na medida em que, na outra ponta tem consumidores frequentes. No momento em que faltarem usuários, não haverá mais tráfico nem circulação de drogas.
É preciso uma ação inteligente, consciente, audaciosa, corajosa, envolvendo toda a sociedade, família, organizações civis, escolas, conselhos tutelares, etc. para desencadear uma campanha de conscientização da nossa juventude, mostrando que, ao mesmo tempo em  que todos condenam o tráfico de drogas, nossos filhos e filhas, podem ser também usuários, e elementos alimentadores dessa continuidade.
A pergunta a ser feita aos consumidores de drogas é esta: Como vocês se sentem sendo os parceiros dos traficantes, os sócios e co-responsáveis por essa situação? Pois essa é a verdadeira posição dos usuários: parceiros, sócios, dos traficantes, financiadores do tráfico. Vamos continuar assim? Não dá para continuar “rodeando o toco”. Temos que  enfrentar o problema de frente.
Não podemos deixar de aplaudir a ação firme e decidida das autoridades que,  nesta oportunidade, conseguiram marcar um ponto a favor da sociedade brasileira.
Esse mal só será extirpado se atuarmos na fonte, ou seja, no usuário. Vamos fazer o trabalho, cada um, começando pela sua própria família e pelos amigos.
E ao mesmo tempo exigir das nossas autoridades uma legislação que puna o usuário.
PS: Trechos deste artigo já foram publicados aqui, sob o título “Das Drogas”, em janeiro deste ano.