Uma das grandes causas de traumas da humanidade ocidental cristã é a imposição do “pecado original”. Esse pecado de origem seria congênito e hereditário, isto é, inato e passaria de uma geração para outra. Todos nós de formação cristã já nasceríamos com a mancha de um pecado para o qual não contribuímos e que nos é imposto por hereditariedade. Nasceu já é pecador. Pecado contraído dessa forma hereditária e não cometido, mas penalizado.
Esse pecado decorre da desobediência de Adão e Eva, que comeram o fruto da árvore do conhecimento, e com isso infringiram a única regra imposta em todo o Paraíso.. O deus bíblico parecia querer que Adão e Eva vivessem para sempre em estado de contemplação. E como ficaria a evolução?
A imposição desse pecado que foi disseminada pela Igreja ganhou força por uma interpretação de Santo Agostinho, no ano 400 da era cristã, em decorrência de sua imensa influência, e o estendeu a todo o gênero humano, como uma consequência da expulsão de Adão e Eva do paraíso.
Assim, o pecado seria herdado por toda a humanidade, cuja salvação dependeria unicamente do sacrifício de Jesus, que teria vindo ao mundo para isso.
Santo Agostinho defendia a pré-destinação, ou seja, a idéia de que a vida de todas as pessoas é traçada anteriormente por Deus. A prevalecer esse entendimento, ao nascimento de cada ser deveria corresponder um manual do proprietário, indicando todo esse traçado.
Mas há nesse pensamento uma grande contradição, porque ele mesmo, Agostinho, em outra interpretação, afirmava que algumas pessoas alcançariam a salvação pelo uso do livre-arbítrio. Então o indivíduo teria a faculdade de determinar a sua conduta de acordo com sua própria consciência, sendo assim o agente da sua salvação, de acordo com os seus próprios atos. Quais seriam essas pessoas privilegiadas e qual o critério para escolhê-las?
Quando da realização do Concílio de Trento (1545-1563), o pecado original foi sacramentado definitivamente na Igreja Católica, consagrando a interpretação de Agostinho, que ganhou, assim, o respaldo oficial da Igreja nesse Concílio, o mais longo de toda a história do catolicismo.
Essa imposição contraria a justiça infinita de Deus: Ele é justo e não nos impõe algo que supere nossas forças e não dá a alguém um auxílio maior do que a outrem. Perante Deus, somos todos iguais, titulares de direitos e de deveres igualitários. A diferença vai decorrer do comportamento de cada um.
E foi exatamente essa a tese do monge bretão Pelágio (360-435), que corajosamente se contrapôs ao todo-poderoso bispo Agostinho, cuja palavra era lei nos lugares de influência da Igreja Católica. Segundo Pelágio, o pecado de Adão, afeta apenas a Adão, não seria congênito. Ao homem foi dada absoluta liberdade: a vontade do homem é perfeitamente livre, dependente apenas de si, para evitar o pecado. A essa doutrina foi dado o nome de pelagianismo, em homenagem ao seu autor.
O importante é entender que as respostas, todas, estão dentro de nós. O que implica a consciência da responsabilidade de cada um. Nada é certo, nada é errado. O que existem são consequências.
Quando começamos a despertar para o verdadeiro significado da nossa encarnação, percebemos que somos seres em evolução; nenhum de nós foi creado (assim mesmo, com e) pronto e acabado. Tudo vai depender dos nossos atos e essa situação nos põe como verdadeiros construtores do nosso ser – e como tal –, parceiros de Deus. E isso se constitui no grande encanto da nossa existência.
A única certeza do que possuiremos em toda a nossa encarnação é o nosso corpo. Que deixaremos quando desencarnarmos.
Assim, libertando-nos da pecha do pecado original pela consciência do que somos verdadeiramente, cabe-nos fazer a nossa parte, porque da nossa vida, só nós decidimos.
Somos creados originalmente livres, maravilhosamente livres e responsáveis pelo nosso destino, responsáveis por tudo aquilo que fizermos, pois na medida exata do que dermos, receberemos. Entender isso é o começo da libertação. Não existe nenhuma mágica. É dar e receber, como magistralmente ensinou Jesus.