Campo Grande sempre foi uma cidade de cidadãos marcantes. O professor Castro (Arassuay Gomes de Castro) foi um desses. Tão marcante que hoje, depois de mais de cinco anos de seu falecimento, ele continua presente na memória de quem com ele conviveu de perto. No Suplemento Cultural, editado pela Academia de Letras, publicado no Correio do Estado, edição de 28 de maio último, lá estava ele com o seu artigo: “A Origem da Mitologia”.
No último dia 16 de abril, ele completaria 85 anos. Nesse dia foi lançada uma coletânea de seus artigos pelo Instituto Histórico e Geográfico, reunidos no livro “Escritos”.
Nos anos 50, ele foi meu professor de latim e de português no Ginásio Barão do Rio Branco, que funcionava no período noturno no prédio do Colégio Joaquim Murtinho, na Avenida Afonso Pena.
Quando voltei para Campo Grande, em 1970, oriundo de São Paulo, representando a Univest Fundo de Investimentos, encontrei na rua a Mariazinha, mulher dele e irmã do meu grande amigo Flaviano Carvalho. Conversando sobre vários assuntos, ela me perguntou em que eu estava trabalhando, eu expliquei que era representante de vendas e que precisava contratar mais gente. Ela me disse, com entusiasmo: “Procure o Castro. Ele sabe vender”.
Quando me despedi dela, fui imediatamente procurá-lo. Encontrei o meu amigo sentado a uma mesa, no IAPC – o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Comerciários, de onde ele era funcionário, com uma cara abatida e prostrada, o olhar perdido ao longe.
Quando me apresentei e falei do meu propósito de contratá-lo, seus olhos se acenderam, ele pulou e me disse: “Era isso que eu estava esperando”. Dei-lhe as instruções primeiras e no dia seguinte ele já estava logo cedo no meu escritório, pronto para o seu credenciamento e para receber a pasta com o material de venda. Foi um dos melhores profissionais na área de venda de papéis. E como sempre foi muito metódico e econômico, soube aplicar bem o dinheiro ganho.
O Castro, como todo cuiabano, era muito inteligente – na minha opinião três tipos de brasileiros se destacam pela inteligência, pela sagacidade e pela sabedoria: os cuiabanos, os cearenses e os baianos.
Castro se destacou de imediato na nova atividade profissional.
Tinha uma característica interessante: nunca dizia não, mas também não dizia sim. Logo criou a sua própria equipe de vendas. Numa ocasião um vendedor de sua equipe lhe disse sem maiores rodeios: “Professor, vendedor sem carro, é meio vendedor. Eu preciso comprar um carro e não tenho dinheiro, para isso preciso de sua ajuda, já que você é meu chefe, senão vou mudar de equipe”. E ele, que tinha o costume de ficar juntando as mãos pelas pontas dos dedos, parou com o movimento dos dedos, pensou, e respondeu: “Você tem toda razão. Então … está liberado da minha equipe, mas continua morando em meu coração”. E encerrou a questão, deixando o colega sem ação.
Depois trabalhamos também no Banco Finasa de Investimentos, e o Castro sempre esteve na linha de frente de produção.
Quando em 1980 eu fui eleito presidente do Sindicato dos Corretores de Imóveis, profissão que ele também abraçou, foi o diretor-secretário da primeira gestão.
Logo depois, resolveu prestar concurso para fiscal de rendas do estado e, sendo aprovado, começou um novo ciclo em sua vida.
Quando nasceu a minha penúltima filha, a de número seis, Flávia, ele e Mariazinha foram seus padrinhos.
O Castro era um sujeito muito tradicional. No Dia de Reis ( 6 de janeiro), nos reuníamos inicialmente na casa do Borba (José Camargo Borba – meu padrinho na Maçonaria) para tomarmos vinho e participar da cerimônia ritualística de degustação da romã (que ele encenava com muita compenetração e seriedade), relatando o seu significado e o que representavam os Reis Magos. Me Lembro até hoje de como as minhas filhas acompanhavam magnetizadas, com um olhar de reverência a forma como ele conduzia essa cerimônia. Depois demos continuidade a essa tradição em minha casa.
O professor Castro deixou muitas saudades e um exemplo perene que permanece.