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Heitor Freire

Nos tempos da FUCMAT II

Este episódio que narro a seguir, foi dos mais marcantes da minha vida acadêmica:    
Este fato aconteceu em março de 1979, na aula magna da Faculdade de Economia, proferida pelo então governador Harry Amorim Costa, no teatro Dom Bosco. Lotadíssimo.
Como representante do corpo discente da Faculdade de Direito, fui convidado e ali me fiz presente, sentando-me na primeira fila em frente ao microfone, atitude que depois me veio a ser bem útil.
Ao terminar a aula magna, o padre Arlindo Pereira Lima, diretor da Fucmat, presidindo a solenidade, colocou a palavra livre para perguntas.
Como estava na primeira fila, levantei-me logo para ser o primeiro a falar, dirigi-me diretamente ao governador, e disse: “Senhor governador, o presidente Geisel ao encaminhar a lei complementar que criou o nosso Estado, proporcionou ao nosso povo uma alegria indizível, por atender a um anseio muito antigo da nossa população; mas, ao anunciar o seu nome como nosso primeiro governador, criou uma frustração muito grande, por ser o senhor uma pessoa de fora, que pode e deve ser respeitável por todos os títulos, mas que é totalmente desconhecido da nossa população. O nosso povo não sabe nem pronunciar o seu nome direito. Nós não temos nada contra nossos irmãos que de outras partes vêm conosco trabalhar para o desenvolvimento do nosso Estado. São todos muito bem-vindos, mas venham primeiro, comer conosco um saco de sal, para depois então, conhecendo nossa gente, nossos anseios, nossos problemas, pretender governar-nos. Na montagem do seu governo, verificamos que o seu secretariado é composto também por gente de fora, pergunto-lhe então: ‘O senhor não confia em nossa capacidade e  em nossa gente, ou o senhor acha que não temos competência?” Nesse momento, fui fortemente aplaudido.   
A seguir, convidei-o para participar de uma mesa redonda com os universitários para que pudéssemos avaliar o seu programa de governo, no que ele imediatamente concordou. Então, aí foi o grande erro, insisti com ele para marcar naquele momento uma data e ele alegou que teria que consultar sua agenda, e eu voltei a insistir. Aí recebi uma vaia ensurdecedora, daquelas de tirar qualquer cidadão do prumo.
Como a minha cadeira estava a apenas dois passos do local onde me encontrava, pude dirigir-me sem maiores tropeços àquele local, embora totalmente fora de esquadro.
Agora, por uma questão de justiça, devo dizer que o dr. Harry foi o único governador, de todos os que já administraram o nosso Estado, que tinha um programa de governo.
Além disso, o Diário Oficial publicava diariamente o valor do saldo de caixa do tesouro. Coisa nunca mais vista por aqui.
Conversando outro dia com o dr. João Pereira da Rosa, este me dizia que como assessor próximo do dr. Harry,  contatava os prefeitos para alocação e pagamento das verbas administrativas, e que estes quando chegavam ao seu gabinete e recebiam o cheque correspondente, ficavam muito surpresos e alegres, dizendo inclusive que não acreditavam, porque era a primeira vez que, chamados por um governador, voltavam de bolsos cheios. Prática que continuou por todo o seu breve governo.
Ao ser demitido, dr. Harry teve a dignidade de permanecer em nosso Estado, demonstrando, assim, de forma inequívoca o seu amor pela nossa terra.
Posteriormente, o dr. Harry teve frustrada a sua pretensão de ser candidato a prefeito de Campo Grande,  por tramóias políticas, quando poderia legitimamente postular essa  candidatura, pois já havia comido conosco quase um saco de sal. A seguir foi eleito deputado federal. Quando secretário de Meio Ambiente, veio a falecer em um acidente automobilístico. Uma grande perda.

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