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Heitor Freire

Ode ao câmera desconhecido

ODE AO CÂMERA DESCONHECIDO
Há uma estátua ao soldado desconhecido erigida em algumas cidades da Europa, representando um reconhecimento àquele que lutou anonimamente arriscando sua vida nas inúmeras guerras que se sucederam desde sempre. O monumento homenageia o soldado da Primeira Guerra Mundial.
Penso que se deve também erigir um monumento ao câmera desconhecido, aquele profissional que enfrenta muitos perigos e dificuldades para nos proporcionar informações e notícias.
Quando nós, nos deliciamos com as matérias apresentadas pela televisão, em nenhum momento paramos para avaliar o quanto custou para que aquelas imagens chegassem à nossa casa. Os câmeras são os profissionais que vivem situações de risco para nos ofertar aquele deleite ou informação, e não merecem, salvo raríssimas exceções, qualquer comentário a respeito do que sofreram para apresentar essas cenas, pelos perigos, pelos perrengues vividos, pela ansiedade quanto à qualidade do trabalho.
Há um caso clássico: o fotógrafo e cinegrafista argentino Leonardo Henrichsen, que viajou ao Chile em junho de 1973. Ele era o câmera freelancer contratado por uma televisão sueca para documentar sobre o que acontecia na cidade de Santiago. Foi assassinado por um oficial chileno enquanto cobria a tensão que antecedeu o golpe militar que derrubou o presidente Salvador Allende. Filmou o seu próprio assassinato. As imagens de sua morte ficaram famosas na série documental “A Batalha do Chile”, de Patrício Guzman.
Um dos meus genros, Reynaldo Zangrandi Júnior, casado com a Raquel, é cinegrafista. Ele viaja o mundo para gravar cenas de documentários com os mais variados motivos. E como tal, tem muitas histórias para contar. Hoje, para ilustrar, relato dois fatos que ele viveu e que são bem representativos do que afirmei acima.
O primeiro aconteceu durante uma viagem por um afluente do rio Negro, perto de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. Isso ocorreu nos anos 90, em uma produção para a ZDF, TV Alemã. Filmavam um documentário sobre uma reserva no Alto Rio Negro. Por motivo de segurança, viajavam sempre com pelo menos dois barcos. Foi a sorte. De repente o motor falhou. O barco perdeu velocidade e força e foi arrastado em direção à corredeira. A diretora Petra Schulz gritou para o Reynaldo agarrar um galho preso à margem do rio: ele pulou em direção à frente da lancha agarrando o galho que arranhava a lateral do barco enquanto descíam a correnteza sem motor e sem controle do que poderia acontecer. Imediatamente após o pulo, todos que estavam no barco se agarraram um ao outro e  Petra às pernas do Reynaldo Ele conta que nunca se esqueceu daquele pulo que salvou o dia e provavelmente as suas vidas.
O segundo momento foi durante uma produção para o National Geographic sobre um biólogo brasileiro especialista em jacaré açu, Ronis da Silveira. Ele fazia um estudo de manejo da população do animal no Amazonas. Estavam bem perto do leito quando encontraram um jacaré descendo em direção ao rio. O plano era maravilhoso, pois o bicho tinha um peixe na boca, o que proporcionou um belo close do animal. Mas a posição do barco fechava o caminho de volta do jacaré, que pesa uns 300 quilos e media cinco metros de comprimento. Reynaldo ficou frente a frente com o bicho, que tentava voltar para o rio, mas o barco interrompia o caminho. Assim que o barco tocou a margem, em questão de segundos, o jacaré deu um salto, atravessou por cima dele e do técnico de som, alcançando a água do outro lado do barco. Foi um susto federal.
Apesar do perigo ele não escolheria outra profissão. E de todos os males, o pior é a saudade de casa.
Heitor Freire – Corretor de imóveis e advogado.

Há uma estátua ao soldado desconhecido erigida em algumas cidades da Europa, representando um reconhecimento àquele que lutou anonimamente arriscando sua vida nas inúmeras guerras que se sucederam desde sempre. O monumento homenageia o soldado da Primeira Guerra Mundial.

Penso que se deve também erigir um monumento ao câmera desconhecido, aquele profissional que enfrenta muitos perigos e dificuldades para nos proporcionar informações e notícias.

 

Quando nós, nos deliciamos com as matérias apresentadas pela televisão, em nenhum momento paramos para avaliar o quanto custou para que aquelas imagens chegassem à nossa casa. Os câmeras são os profissionais que vivem situações de risco para nos ofertar aquele deleite ou informação, e não merecem, salvo raríssimas exceções, qualquer comentário a respeito do que sofreram para apresentar essas cenas, pelos perigos, pelos perrengues vividos, pela ansiedade quanto à qualidade do trabalho. 

 Há um caso clássico: o fotógrafo e cinegrafista argentino Leonardo Henrichsen, que viajou ao Chile em junho de 1973. Ele era o câmera freelancer contratado por uma televisão sueca para documentar sobre o que acontecia na cidade de Santiago. Foi assassinado por um oficial chileno enquanto cobria a tensão que antecedeu o golpe militar que derrubou o presidente Salvador Allende. Filmou o seu próprio assassinato. As imagens de sua morte ficaram famosas na série documental “A Batalha do Chile”, de Patrício Guzman.

Um dos meus genros, Reynaldo Zangrandi Júnior, casado com a Raquel, é cinegrafista. Ele viaja o mundo para gravar cenas de documentários com os mais variados motivos. E como tal, tem muitas histórias para contar. Hoje, para ilustrar, relato dois fatos que ele viveu e que são bem representativos do que afirmei acima.

O primeiro aconteceu durante uma viagem por um afluente do rio Negro, perto de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. Isso ocorreu nos anos 90, em uma produção para a ZDF, TV Alemã. Filmavam um documentário sobre uma reserva no Alto Rio Negro. Por motivo de segurança, viajavam sempre com pelo menos dois barcos. Foi a sorte. De repente o motor falhou. O barco perdeu velocidade e força e foi arrastado em direção à corredeira. A diretora Petra Schulz gritou para o Reynaldo agarrar um galho preso à margem do rio: ele pulou em direção à frente da lancha agarrando o galho que arranhava a lateral do barco enquanto descíam a correnteza sem motor e sem controle do que poderia acontecer. Imediatamente após o pulo, todos que estavam no barco se agarraram um ao outro e  Petra às pernas do Reynaldo Ele conta que nunca se esqueceu daquele pulo que salvou o dia e provavelmente as suas vidas.

O segundo momento foi durante uma produção para o National Geographic sobre um biólogo brasileiro especialista em jacaré açu, Ronis da Silveira. Ele fazia um estudo de manejo da população do animal no Amazonas. Estavam bem perto do leito quando encontraram um jacaré descendo em direção ao rio. O plano era maravilhoso, pois o bicho tinha um peixe na boca, o que proporcionou um belo close do animal. Mas a posição do barco fechava o caminho de volta do jacaré, que pesa uns 300 quilos e media cinco metros de comprimento. Reynaldo ficou frente a frente com o bicho, que tentava voltar para o rio, mas o barco interrompia o caminho. Assim que o barco tocou a margem, em questão de segundos, o jacaré deu um salto, atravessou por cima dele e do técnico de som, alcançando a água do outro lado do barco. Foi um susto federal.

Apesar do perigo ele não escolheria outra profissão. E de todos os males, o pior é a saudade de casa.

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